sexta-feira, maio 26, 2017

Mocumentário: testando as fronteiras entre a realidade e a ficção



Um gênero cinematográfico que sempre suscitou discussões sobre a questão da realidade-ficção foi o documentário. Em uma abordagem mais clássica, o documentário é visto como o oposto da ficção, reproduzindo a bipolaridade ficção-realidade.
            Mas um novo gênero surge exatamente para contestar essa diferenciação: o mocumentary (ou, aportuguesando, mocumentário). 
            Provavelmente o primeiro exemplo célebre de mocumentário tenha sido Zelig, de Woody Alenn, de 1983. O pseudo-documentário é ambientado na década de 1920 e fala sobre Leonard Zelig, um um homem que tem a capacidade de mudar sua aparência para se adequar ao meio. Se ele está no meio de mafiosos, começa a se parecer com mafiosos, se está no meio de médicos, parece um médico. É um verdadeiro camaleão humano.

Uma das estratégias usadas para diluir o limite entre realidade e ficção é o uso de pessoas reais, como a escritora Susan Sontag, o psicólogo Bruno Bettelheim, que, com seus depoimentos, reforçam a verossimilhança da narrativa. O filme ainda usa outros recursos de documentários, como imagens de cinejornais, fotos da época e até mesmo áudios das consultas do protagonista com sua psicóloga (devidamente acrescidos de ruídos que os tornam mais realistas).
O mocumentário, portanto, testa os limites entre o ficcional e o real, entre o documentário e a ficção, levando o espectador a indagar-se até que ponto essa separação é válida.
Atualmente há vários exemplos famosos de mocumentários. Entre eles destaca-se o filme Borat, e o seriado Modern Family.
Borat, filme dirigido por Sasha Baron Cohen, de 2006, satiriza o modo de vida americano ao apresentar “O segundo melhor repórter do glorioso país Cazaquistão viaja à América”, como diz seu subtítulo, que vai aos Estados Unidos aprender sobre o modo de vida daquele país.
Como elemento reforçador dessa sátira, o ator permanece no personagem mesmo quando dá entrevistas de divulgação do filme.

Modern Family é um seriado criado por Christopher Lloyd e Steven Levitan. A série mostraria as gravações de um cineasta europeu que no passado havia feito um intercâmbio na casa dos Pritchett e decidiu retornar aos Estados Unidos para fazer um documentário sobre “sua família americana”. Após a recusa de outras produtoras, a ABC resolveu produzir a série, mas com a condição de que a trama do diretor fosse retirada da história, ficando apenas as ações das três famílias e seus depoimentos para a câmera, que comentam e costuram os acontecimentos.
O enorme sucesso de público e de crítica (o seriado já está na sétima temporada e já recebeu 15 prêmios Emmy) despertou atenção para o gênero mocumentário, mostrando sua importância atual.

Embora não utilize totalmente a linguagem dos documentários, os depoimentos para a câmera e a abordagem sobre temas recentes (como a liberação do casamento gay) criam um clima de verossimilhança próprio dos documentários ou reality shows. Seu sucesso é indício da familiaridade da audiência com obras que testam os limites entre o ficcional e o real.  

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