quinta-feira, dezembro 07, 2017

Entropia e a tendência ao caos

A entropia é um dos mais instigantes e também um dos mais controversos conceitos da cibernética. Nilson Lage define entropia como o oposto de redundância e equivalente ao conceito de informação: "O conceito de redundância relaciona-se com alta previsibilidade; o de entropia com baixa previsibilidade".  Nobert Wiener, o criador da cibernética, vai no sentido oposto: "é possível interpretar a informação conduzida por uma mensagem como sendo, essencialmente, o negativo de sua entropia".  A entropia é vista aqui não como informação, mas como redundância.  Décio Pignatari concorda com as idéias de Wiener. Para ele, a entropia negativa é igual à informação: "Na desdiferenciação de formas e funções , teríamos a tendência caótica ou entrópica, cujo ponto extremo seria a uniformização geral, o caos, onde não haveria possibilidade de informação, nem troca possível de informação".  Epstein, por sua vez, lembra que a fórmula para medir a entropia, proposta por Clausius em 1864 é idêntica à proposta por Shannon em 1948 para medir a informação de uma mensagem.  Por outro lado, a entropia pode ser tratada como uma espécie de ruído (eu mesmo já o fiz em minha dissertação de mestrado).
 Afinal, o que é entropia?  A palavra entropia foi usada pela primeira vez em 1850, pelo físico alemão Rudolf Julius Clausius (1822-1888). A origem da palavra são os radicais gregos em (dentro) e tropee (mudança, troca, alternativa).  O termo foi amplamente trabalhado na física para designar a Segunda Lei da Termodinâmica.
Há várias maneiras de enunciar essa lei, mas talvez a mais completa seja:
"Todo sistema natural, quando deixado livre, evolui para um estado de máxima desordem, correspondente a uma entropia máxima".
 A entropia representa a perda de energia do universo, que ocorre a todo instante, razão pela qual os cientistas dizem que o universo caminha para a morte térmica. Ela é irreversível. Por isso, essa energia perdida jamais será recuperada.
Esse sentido único da entropia fez com que os físicos a chamassem de "a flecha do tempo". 
Para exemplificar, imagine duas canecas de alumínio, uma a 80, outra a 20 graus centígrados. Se encostarmos uma na outra, o que ocorrerá? A caneca quente esfriará e a fria esquentará. Chegará um ponto em que as duas estarão à temperatura uniforme de 50 graus.  Essa experiência fez com que Clausius enunciasse a lei da entropia da seguinte maneira: "É impossível haver transferência espontânea de calor de um objeto frio para outro mais quente".
Outra característica da entropia é a mistura indiferenciada.  Para visualizar essa propriedade, basta imaginar dois recipientes ligados por uma comporta, um com tinta branca, outro com tinta vermelha. Ao abrirmos a comporta, as duas tintas irão se misturando aos poucos, até chegar o ponto em que não conseguiremos distinguir onde está o branco e onde está o vermelho.  Ou seja, a tinta entra em estado desordenado, pois a ordem pressupõe uma compartimentação de coisas. Uma estante em que livros e CDs estejam misturados é mais caótica do que uma estante em que os livros estejam em uma prateleira e os CDs em outra.
Um detalhe interessante da mistura das tintas é que as mesmas jamais voltarão à posição inicial, mesmo que esperemos por toda a eternidade.
É a flecha do tempo, o sentido único da entropia.
A entropia tem, também, o sentido de degradação. Assim, a velhice que vai aos poucos tomando conta de nosso corpo é um exemplo da mesma vivenciado por todos nós, diariamente. Esse processo vai se acumulando até redundar na fase final: a morte. Não é por outra razão que os físicos se referem à entropia como a morte térmica do universo.
A palavra entropia foi também usada em administração para designar empresas que se deixam dominar pelo caos, pela degradação.  Lojas em decadência são um exemplo perfeito de como a entropia pode destruir um empreendimento: a sujeira toma conta do lugar; a fachada se tornando aos poucos ilegível; as paredes desbotam; o dono não tem dinheiro o bastante para fazer as reformas necessárias; e os empregados, desestimulados, não se empenham para vender mais, diminuindo a renda da firma e acelerando sua falência.
Uma vez iniciado o processo de entropia em uma empresa, somente uma injeção maciça de dinheiro pode salvá-la. Na verdade, é mais prático e barato criar uma empresa nova do que tentar reerguer uma  dominada pela entropia.
 Na comunicação, a entropia está relacionada ao grau de desorganização da mensagem. Quanto mais desorganizada, mais entrópica.  Nos meios acadêmicos, costuma-se brincar que o melhor exemplo de entropia seria um macaco utilizando uma máquina de escrever. O resultado dessa traquinagem: uma mensagem totalmente desprovida de código e entrópica. Portanto, incompreensível.
O código é utilizado com o objetivo de evitar que o caos tome conta da mensagem.
A entropia, no entanto, pode ter uma utilização positiva na comunicação, pois uma mensagem extremamente ordenada é também uma mensagem previsível e, portanto, redundante. A característica de imprevisibilidade da entropia pode dar à comunicação um toque mais original. É o que ocorreu, por exemplo,  com o surgimento da MTV. Diante da estrutura ordenada e previsível das emissoras convencionais, a linguagem entrópica da MTV foi um sopro de criatividade.
A entropia também pode ser usada na diagramação de revistas, como demonstra a revista Trip.
Exemplos de linguagem entrópica também podem ser encontradas no cinema. O filme "Clube da Luta", por exemplo, não só usa uma linguagem caótica, como fala explicitamente do aumento da entropia no mundo atual. A cena em que o personagem principal se auto-flagela é um ótimo exemplo disso.
Vale ressaltar que, uma vez assimilada, essa linguagem entrópica vai se tornando um novo tipo de ordem.
Como diz Umberto Eco, "cada ruptura da organização banal pressupõe um novo tipo de organização, que é desordem em relação à organização anterior, mas é ordem em relação a parâmetros adotados no interior do novo discurso"

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